Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

BEJA

BEJA

30
Jul04

A FELICIDADE

Lumife
15.jpg


.


Só a leve esperança em toda a vida


Disfarça a pena de viver, mais nada


Não é mais a existência resumida


Que uma breve esperança malograda


.

O eterno sonho d'alma desterrada


Que a traz ansiosa e embevecida


E uma hora feliz sempre adiada


E que não chega nunca em toda vida


.

Essa felicidade que supomos


Árvore milagrosa que sonhamos


Toda arreada de dourados pomos


.

Existe sim, mas nunca a encontramos


Porque ela está sempre apenas onde a pomos


E nunca a pomos onde nós estamos.


.

(Fernando Pessoa)


28
Jul04

SONETO CATIVO

Lumife
360.jpg


.

Se é sem dúvida Amor esta explosão


de tantas sensações contraditórias;


a sórdida mistura das memórias


tão longe da verdade e da invenção;



.

o espelho deformante; a profusão


de frases insensatas, incensórias;


a cúmplice partilha das histórias


do que os outros dirão ou não dirão;


.

se é sem dúvida Amor a covardia


de buscar nos lençóis a mais sombria


razão de encantamento e de desprezo;


.

não há dúvida, Amor, que te não fujo


e que por ti, tão cego, surdo e sujo


tenho vivido eternamente preso!


.

David Mourão-Ferreira


27
Jul04

MÁGOA

Lumife
203.jpg


.




Medas de trigo ao sol - Agosto,



Tudo o calor do Sonho amadurece;



Só a verdade amargura do meu rosto



Permanece!



.


Até me lembro que não sou da vida!



Que não pertence à terra esta tristeza...



Que sou qualquer desgraça acontecida



Fora do seio-mãe da natureza.



.



E contudo não sei de criatura



Que mais deseje ter esta alegria



De um fruto azedo que arrancou doçura



Do céu, das pedras e da luz do dia.


.

(Miguel Torga)

Foto de Liliana Pedrosa

26
Jul04

INTERROGAÇÃO

Lumife
401.jpg



.

Neste tormento inútil, neste empenho


De tornar em silêncio o que em mim canta,


Sobem-me roucos bardos à garganta


Num clamor de loucura que contenho.



.

Ó alma da charneca sacrossanta,


Irmã da alma rútila que eu tenho,


dize para onde eu vou, donde é que venho


Nesta dor que me exalta e me alevanta!



.

Visões de mundos novos, de infinitos,


Cadências de soluços e de gritos,


Fogueira a esbrasear que me consome!



.

Dize que mão é esta que me arrasta?


Nódoa de sangue que palpita e alastra...


Dize de que é que eu tenho sede e fome?!



.

(Camilo Pessanha)

24
Jul04

PEDRA FILOSOFAL

Lumife
351.bmp


.


Eles não sabem que o sonho


é uma constante da vida


tão concreta e definida


como outra coisa qualquer,


como esta pedra cinzenta


em que me sento e descanso,


como este ribeiro manso


em serenos sobressaltos,


como estes pinheiros altos


que em verde e oiro se agitam,


como estas aves que gritam


em bebedeiras de azul.


.

Eles não sabem que o sonho


é vinho, é espuma, é fermento,


bichinho álacre e sedento,


de focinho pontiagudo,


que fossa através de tudo


num perpétuo movimento


.

Eles não sabem que o sonho


é tela, é cor, é pincel.


base, fuste, capitel,


arco em ogiva, vitral,


pináculo de catedral,


contraponto, sinfonia,


máscara grega, magia,


que é retorta de alquimista,


mapa do mundo distante,


rosa-dos-ventos, Infante,


caravela quinhentista,


que é Cabo da Boa Esperança,


ouro, canela, marfim,


florete de espadachim,


bastidor, passo de dança,


Columbina e Arlequim,


passarola voadora,


pára-raios, locomotiva,


barco de proa festiva,


alto-forno, geradora,


ultra-som, televisão,


desembarque em foguetão


na superfície lunar.


.

Eles não sabem, nem sonham


que o sonho comanda a vida.


Que sempre que o homem sonha


o mundo pula e avança


como bola colorida


entre as mão de uma criança.


.

(António Gedeão)

11
Jul04

CATARINA EUFÉMIA

Lumife
95.bmp

O primeiro tema da reflexão grega é a justiça



E eu penso nesse instante em que ficaste exposta



Estavas grávida porém não recuaste



Porque a tua lição é esta: fazer frente



.



Pois não deste homem por ti



E não ficaste em casa a cozinhar intrigas



Segundo o antiquíssimo método obíquo das mulheres



Nem usaste de manobra ou de calúnia



E não serviste apenas para chorar os mortos



.



Tinha chegado o tempo



Em que era preciso que alguém não recuasse



E a terra bebeu um sangue duas vezes puro



Porque eras a mulher e não somente a fêmea



Eras a inocência frontal que não recua



Antígona poisou a sua mão sobre o teu ombro no instante em que morreste



E a busca da justiça continua


.

(Sophia Andersen)

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2009
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2008
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2007
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2006
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2005
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2004
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D